segunda-feira, 28 de novembro de 2011

“Testamento” (18/11/2011)

Vou levar comigo todo amor
O lençol, o travesseiro e o cobertor
A foto na cabeceira e a 3x4 da carteira
Estou levando os casacos e o cheiro do armário
O reflexo atrás de ti no espelho do quarto
Não vai encontrar a escova e o aparelho de barbear
Levei a tolha que roubei do hotel com vista pro mar
Rasguei-me também de todas as fotografias
Não deixei nenhum presente que te dei
Coloquei na mala todo meu pedaço de vida
Destruí, uma por uma, nossas fitas
Desfiz sem dó, laço por laço
Não ficou imagem, som, nem palavra
Não se engane, carreguei o silêncio porta afora
Chave de fenda, martelo, prego, parafuso
Suor, saudade, sorriso e abraço
Pode olhar, não tem meus CD’s na prateleira
O livro do Manuel de Barros não está no criado mudo
Eu lavei e guardei toda louça
Coloquei no lugar a poltrona da sala
Desprogramei a secretária eletrônica e a televisão
Não guardei nenhum filme que planejamos ver
Já mudei as datas das minhas férias
Minuciosamente apaguei meu nome da tua agenda
Desmarque o florista, levei tudo que plantei
Rosas, lírios e as azaléias
O violão que aprendi apenas tua serenata
Ao cozinhar não procure minhas receitas
Não terá mais na boca nem meu beijo, nem meus sabores
Não passearemos no parque
A comunhão das nossas mãos será apenas desejo teu
À noite, a sombra no corredor não será minha
Pode amassar o travesseiro, não marcará minha presença
Perca o costume de parar nas lojas de esporte
Não volte ao restaurante da primeira vez
O jeito que gosto do café foi comigo
Jamais gostei de pizza fria
Levei a cópia da chave e fechei a porta
Não há ninguém além de você na casa
Passará dias me buscando entre as cortinas
Nem mesmo minhas cartas chegarão
Ficará sem meu olhar de adeus
Deixo-lhe somente nossa memória
Assim será tua escolha, me esquecer.

Ass: Danilo Mendonça Martinho

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

“Virando a página” (14/11/2011)

Desenho um novo contorno. Quero outra cor para este cotidiano. Dispenso os tons de cinza, abro a janela e evito as gotas escorrendo pelo vidro. Lavo o rosto, deixo um sorriso no espelho, volto a me preocupar com minha roupa. Faço superstições ao tropeçar, planejo alguma fala perdida, roubo flores no parque. Invento novos motivos para um encontro. Visto-me de um novo espírito notável, recuperando algum reflexo de vida. Desfaço os esconderijos, falo sem mais pudores ou restrições de sentimentos. Na busca de qualquer inteiro firmo meu passo, abraço de novo o risco. Há algo nascendo e a chance é a melhor coisa que podem te dar. Abro o peito para o mundo, pois tem algo aqui fora. Além de qualquer alma, há algo que a completa. Esboço uma nova realidade e vão se construindo os personagens. Tudo agora é possível, como não ser feliz com isso?

Ass: Danilo Mendonça Martinho

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

“Trancafiado” (13/11/2011)

As paredes do meu quarto me confortam
Não quero deixar as cobertas
Se ainda fosse alguma preguiça
Mas é o mundo que deixou de ser vontade
Quero continuar girando aqui dentro
Um desaparecimento discreto
Abdicando de toda e qualquer luta
Estou enfadado deste universo
O trabalho que só consome
O sentimento que apenas desespera
Não me incomoda essa clausura
Aqui tudo está ao meu alcance
A vida atrás de uma janela
E absolutamente nada que me exija

As vezes é tanto que nos falta
Ao menos meu quarto posso preencher

Ass: Danilo Mendonça Martinho

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

“Liberdade de ser” (12/11/2011)

Na beira do hoje há uma promessa
O pôr-do-sol confunde com sonho
No que se pode tocar?
O que me esfria as entranhas
São essas eternas imagens de desejos
É tão fácil inserir-se na ilusão

Foi o querer desesperadamente
Levou-me além da sinceridade
Disse palavras que me engasgaram
Mas a vontade não era sentir

Apenas isso me incomoda no sonho
Saber onde traçar o limite
Não me é saudável remoer tantas possibilidades
Meu caro dia, não posso comprar tua esperança
Hoje é necessário viver.

Perverso é tudo permanecer chance
Alforria ao talvez.

Ass: Danilo Mendonça Martinho

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

“Anulação” (09/11/2011)

Andamos de mãos dadas
Beijos na fila do cinema
Jantar aos sábados
Abraços fortes e comuns
Olhares com brilho exclusivo
Um verso virou rotina
O romance sempre amanhecendo
O encontro quase um dever
Os presentes não são mais surpresa.
O que uniu diluiu-se
Temos um anel de compromisso
Um retrato na cabeceira
Uma comodidade incômoda
Saciamos efêmeros desejos
Sentimos por definição
A presença virou costume
Perdemos um pouco a cor
Nos confundimos com a paisagem
O amor nos tornou comuns.

Ass: Danilo Mendonça Martinho

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

“Carta do Desencanto” (06/11/2011)

Amor, venho esvaziar todo seu sentido. Eu que um dia roubei teu significado do dicionário. Já sou incapaz de repetir o abraço. As flores murcharam, abandonei-as em um inverno qualquer. Levei-te para toda palavra, te fiz contorno do meu universo. Meus olhos padeceram de cor, você escureceu em algum tom de cinza. Escrevo para desconstruir-te, apagar a marca do meu horizonte.

Tua falta não alimenta a solidão do meu quarto, já não é nem mais sombra. Desfaço meu sorriso a cada reciprocidade que não posso lhe dar. Desenlaço meus dedos em versos no papel cheio de letras frias. O “te” já não conjuga com você. Engoli o gosto amargo de não te querer. Preciso me desmanchar de qualquer virtude, desvencilhar-me da esperança. Não sou. Quero voltar a ser comum, paisagem, memória e talvez nem isso. Há de sobrar entre nós apenas um substantivo indefinido. Aqui mando a última coisa que posso lhe dar: Amor .

Ass: Danilo Mendonça Martinho

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

“Chuva de Verão” (17/10/2011)

Talvez seja louco
Mas gosto dos contornos cinzas
O jeito que me agride com gotas
O vento que sopra contra

Gosto quando me toma os céus
Faz de tudo teu véu
Disfarçando as brechas de luz
Há uma esperança atrás de ti
Desmanchará essa máscara negra
Desvendando tua alma azul anil

Devaneio seria não abraçar-te
Não abrir o sorriso na tempestade
Tudo que leva é porque deixo
Quero ser como Tu
Destes contornos cinzas
Sobre apenas o céu azul

Ass: Danilo Mendonça Martinho

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

“Paciência” (14/10/2011)

O romance vai voltar
Independente da primavera
Logo, indiferente as minhas vontades
Preciso apenas acomodar o vazio
Ver o horizonte como mais um passo
Deixar envelhecer a lembrança
Caminhar de mãos com a solidão
O real é que vai me salvar

Não vou abandonar um centímetro de vida
Quero tudo plenamente mais uma vez
Não abro mão nem dos pedaços
Sairei do sonho para a vida
Enquanto não vale dormir
Não aprisionarei o meu sentir
Tenho certeza de que ele irá voltar

Ass: Danilo Mendonça Martinho