quinta-feira, 30 de junho de 2016

“Encharcado” (06/06/2016)

A chuva começa
Vem o medo da poça
Do guarda-chuva virar
Entre quem corre e quem desiste
A natureza não faz distinção
Cai em cima para depois perguntar
Disfarcei-me de árvore
Imóvel e braços abertos
Aproximei dela como se fossemos um só
Mas minha parceira estava anoréxica
“Ainda é outono meu caro poeta
E não tem mais folhas para segurar”

Ass: Danilo Mendonça Martinho

segunda-feira, 27 de junho de 2016

“Miopia” (05/06/2016)

Caeiro falava sobre o que via
Falava das cousas sem mistério
Desconheceu o intransponível do concreto
As paisagens dos seus olhos
Se escondem do arranha-céu...
Opa! Onde já se viu palavra pregando o impossível
Aliás hoje tem mais significado que palavra
E sem dúvida muito mais ilusão
Não conseguiria falar o que vejo nem se abrisse os olhos
O homem construiu sobre as verdades
Mudou geneticamente as nossas manhãs
E o Sol que nasce hoje sobre seu rebanho
Tem a cor dos filósofos
Cheio de possibilidades e nenhuma definição

Ass: Danilo Mendonça Martinho

quinta-feira, 23 de junho de 2016

“Origens” (02/06/2016)

Ando pensando demais no que não ando fazendo
Ando fazendo menos coisas ainda
Deve estar sobrando poesia em algum lugar
Tantos são os pensamentos que evito
A verdade se esconde num fechar de olhos
A dor por outro lado não conhece saída
Alguma hora deixo tudo para trás para sobrar eu
E independente de qualquer felicidade
Confundir o silêncio com um pouco de paz
Depois que me ausento o mundo escurece
O chão está molhado e a noite fria
Foi num dia desses que não estava onde me deixei
Toda água da chuva volta para o céu
Quem sabe num dia de calor minha alma volte para casa
Cada verso que esqueço, me esqueço num canto da vida
Que da terra ao menos floresça o que faça sentido
Minha raiz sempre foi essa caneta
E mesmo o mais alto fruto, aqui há de voltar

Ass: Danilo Mendonça Martinho

quinta-feira, 16 de junho de 2016

“Fra(n)quezas” (15/05/2016)

Um dia uma garota que conheci, e digo garota pois isto era o quão jovem era meu coração nos romances, me disse não, me disse como tantas outras em um silêncio e distância dos quais me escapou de qualquer palavra em um ato covarde de ver uma paixão passar como se fosse uma tempestade lá fora, esperando algum tempo bom. Foi neste silêncio que te conheci, foi na esperança desmedida de ser feliz que te encontrei, não foi a ideia de permanência, mas de me desentrelaçar dos meus conceitos, de liberdade, que abracei o teu beijo e teus braços. Foi a ideia de me permitir, sem procurar as consequências. Confesso que fui ingênuo. Como meu garoto coração ainda o era. Você partiu e com medo que ficasse alimentando nosso momento como algo contínuo, tentei evitar as palavras, tentei me desviar do compromisso, tentei da mesma forma covarde me esconder de um coração que conquistara. Ciente do pecado, ou envolvido na solidão, mergulhei. Pois se alguém que vivia ao meu lado, aos meus abraços, as minhas palavras e sorrisos não me queria.....existia alguém que a milhares de quilômetros, depois de poucos dias, sem saber muito mais do que meu nome e poesia, estava disposta para uma paixão. Mergulhei, e mergulharia de novo. O meu erro foi manter meu plano só para mim. Eu estava ali tentando viver aquela paixão, tentando ser feliz em vez de apenas me lamentar. Existia alguém que me queria e por que não tentar viver o romance? Eu vim a descobrir, que o amor de um lado só não sustenta duas pessoas. Eu juro que quis que fosse minha saída da melancolia, que fosse o caminho para felicidade, para o amor idealizado. Mas não era, simples como foi te encontrar, também te perdia, e me cabia a árdua missão de trazer a tona e a consciência o final daquela história que mergulhei de cabeça, e te levei junto, mas só eu sabia que poderíamos atingir as pedras e não o mar. Terminei de uma maneira que contornasse essa verdade e a falta desta sinceridade veio a me perseguir meses depois quando apareceu na porta de casa, ainda tentando, ainda ligada aquela ilusão que inadvertidamente criei. Fui cruel, fui pequeno, fui vil, como todo dia alguém já foi, mas jamais vão querer admitir. Fui um qualquer, fui um clichê, fui uma emoção arrependida transformada em uma raiva cega e no desespero de encontrar um ponto final. Não espero te encontrar. Não estou pedindo desculpas. Pois hoje meu homem coração está amadurecido, mas foi porque um dia o garoto cometeu os seus erros. Erraria contigo de novo, pois foi bom, embora tudo que tenha feito de ruim, embora toda mágoa, eu aprendi, eu cresci e vivi aquela paixão. Não quero te tirar a tristeza, nem te causar nenhum perdão. Quero na verdade até que me odeie, que me seja indiferente, que trate ao desgosto. Mas que faça pelos motivos certos. 

Ass: Danilo Mendonça Martinho

terça-feira, 14 de junho de 2016

“Entre nós” (03/05/2016)

A paz, sem dúvida, está com quem partiu. Consciente da tarefa cumprida, da felicidade deixada, do aprendizado da alma. Ficamos satisfeitos de saber, o coração fica mais tranquilo, mas o âmago se contorce na saudade. É inquietante a ausência instalada de tudo que não vai mais voltar. Um quarto vazio, a porta que não abre, o doce que não se faz mais. Mas será a saudade apenas essa imensidão de outras vidas que ficaremos a carregar? Penso que ela não tem nada de falta. Sentimos, pois foi deixado dentro de nós as marcas das palavras e dos abraços. Os sinais daquelas pessoas que de coração aberto deixaram um pedaço de si para levarmos conosco. E não é qualquer pedaço, é o melhor que elas poderiam oferecer para nossas vidas. A saudade é esta constante presença desses sentimentos. Ela não está aqui para abrir um buraco no coração, mas lembrar as coisas que o une. Ela é a valorização dos presentes que foram dados para nossa alma. Ela quer manter vivo o que guardamos de mais importante. É verdade que ela não tem o calor do corpo, o carinho do gesto, o cheiro da roupa, ela não substitui, mas ela protege aquilo que as pessoas que partiram não gostariam que viéssemos a perder. É conforto saber que seguiram em paz, já a nossa paz de espírito depende em perceber que estarão para sempre em nós. 

Ass: Danilo Mendonça Martinho

segunda-feira, 13 de junho de 2016

“As baratinhas do 8600” (22/04/2016)

No meio daquele suor que te escorre nas costas
O vento parece se desviar das janelas
Os corpos grudados nos bancos estofados
As peles que se roçam enojadas pelo contato
Seguramos firme a cada freada
Procuramos um canto que nos esconda e dê saída
Se o concreto racha, o metal se contorce
E as baratinhas rondam as frestas
Saindo e entrando pelas lâmpadas
Sem chamar atenção do público
Tento não fazer dos meus olhos algum espelho
As mulheres que conheço estariam desesperadas
Mas também começa um coça-coça
Ao perceber que também estou encostado na porta
Quantas delas vivem nessa carcaça?
Este calor as espanta ou atrai?
E reparo toda descostura da sanfona que não toca
Ali deve ter um país inteiro
Agora já estou nas pontas dos dedos
Elas passeiam perto das mãos do vendedor de balas
Dá sinal meu amigo antes que seja tarde
Antes que enxergue o que a rotina distraí
Fico surpreso que o terror não tenha se instalado
Acho que as baratinhas até são discretas
Se escondem antes de qualquer medo
Mas uma vez que a consciência embarca
Essa viagem não vai ter volta

Ass: Danilo Mendonça Martinho

quarta-feira, 1 de junho de 2016

“Veranico n°2” (12/04/2016)

Outono!!!
Sai de baixo do Sol e vem almoçar!
Vem logo menino que passou da hora
Vai pegar insolação
Vai me deixar doente de preocupação

Outono, tá quente demais!!
Daqui a pouco vai precisar chover
Vai acabar com toda tua brincadeira
Vai ficar só você na choradeira
Agora me larga do teu irmão

Ouutooonooo, eu não vou repetir
Ai, se você não entrar neste mundo agora
Eu vou dar pro inverno teus brinquedos
Te tiro do próximo bissexto
E você pode esquecer do jantar
 
Ass: Danilo Mendonça Martinho