Eu lembro quando a chuva vinha ensurdecer meu universo. Estava sempre a imaginar no meu quintal entre os soldados e as corridas disputadas entre os vales e montanhas das caixas sobre o balcão embaixo da janela da cozinha. Era tudo revestido de um azulejo laranja que não escondia sua idade. Foi entre essas mesmas caixas que encontrei um de meus cágados que fugiu enquanto limpava o aquário. Nessa época meu mundo já tinha diminuído e os sonhos já não podiam correr livres, faltava-me espaço no box do chuveiro, na escrivaninha. Fiquei exposto aos olhares que esperavam deixar para trás minha infância. Mas corri outras vezes naquele quintal, mais vezes do que posso me lembrar. Fiz guerras, joguei bola, lamento não ter deitado mais vezes naquele chão. No quartinho dos fundos tinha uma mesa de botão. Tinha também uma saída lateral para o corredor que recordo sempre em tons avermelhados, desses finais de dia engraçados de primavera. Era um calor debaixo daquelas telhas, mas quando chovia era mágico. Isolava todo som, toda vida. As gotas e aquele barulho sempre me confortaram. Mas que problemas tinha? Lá fui criança. Eu lembro do contra-luz na janela da cozinha que fazia de tudo sombra enquanto a chuva insistia lá fora.
Hoje meu quintal é ao ar livre e não consigo decidir se é melhor assim.
Ass: Danilo Mendonça Martinho
Ainda acho que é, poeta.
ResponderExcluirMas a liberdade sempre nos afronta com a perigosa certeza do estabelecido.
Danilo, você me fez recordar a infância...Na infância, tudo é mais mágico, mais fascinante...com tempo, perdemos um pouco o deslumbramento com as coisas e as pessoas.O mundo está carente de infância.
ResponderExcluirUm abraço,
Luana Barcelos
É mais fácil enfrentar o quintal ao ar livre quando mantemos vivo em nós o que nos construiu.
ResponderExcluirVoltar no tempo para reacender saudades e memórias da infância nos ata ao cordão do que hoje somos.
Imagens lindas nessas palavras... ^^'
ResponderExcluir"Hoje meu quintal é ao ar livre e não consigo decidir se é melhor assim."
ResponderExcluirTalvez seja. Liberdade é bom. Mas há um preço a se pagar por ela. Por isso não nos excedamos tanto assim, só um pouco, ou um tantinho a mais. Vai de cada um. Um quintal seguro, apesar de ser bonito de lembrar, não nos basta mais.
Post com cheiro de infância e saudades.
ResponderExcluirSe cuida. Bjs
Me fez lembrar meu vô - que Deus o tenha - e das vezes que o pude visitar. Era tão bom ser criança. Mas ainda sou, assim como você também ainda é.
ResponderExcluirSomos crianças porque ainda sonhamos.
Não mais ingênuos, mas sonhadores.
Beijo doce.
Todo quintal é gostoso, aquele da infância e os que a gente desbrava na vida afora. Só não podemos deixar de tê-los.
ResponderExcluirTenha uma linda semana Danilo e sucesso com o livro!
Abraço
O ar livre nos livra dos ouvidos das paredes.
ResponderExcluirAgora o mundo é um grande quintal.
ResponderExcluirAbraços